Como não poderia deixar de ser, programamos 10 dias de escalada em Rodellar. Não consigo imaginar uma viagem de escalada pela Europa sem uma visita a Rodellar. Localizada dentro do Parque Natural de La Sierra de Guara, na parte espanhola dos Pirenéus, esta pequena e antiga cidade é a porta de entrada para os mais famosos barrancos do parque, como os barrancos de Mascún e Otín. E que barrancos... a visão destes barrancos é um espetáculo à parte. São centenas de falésias à beira-rio formando um labirinto de cânions de calcário permeados por águas cristalinas e gélidas que brotam literalmente da rocha. Aliás, a Surgencia de Mascún, a 15 minutos de caminhada do centro da cidade, é a melhor e mais confiável fonte de água da região, além de dar nome a um setor alucinante com vias de 50 metros de altura (mas qual setor de Rodellar que não é alucinante!?).
Esta combinação barrancos + água virou “esporte”: o barranquismo, que no Brasil é conhecido como “rapel em cachoeira” ou simplesmente “canoying”. Os praticantes de barranquismo na Europa levam este esporte muito a sério, a ponto de haver croquis bem completos das rotas de barranco que contemplam, inclusive, sua graduação de dificuldade. Um dos muitos guias de barranquismo da região chega a ter 104 barrancos (rotas) catalogados. Mas como todo esporte radical, deve ser praticado com instrutores ou guias com experiência e utilizando-se os equipamentos de segurança apropriados. Não é incomum ocorrer a morte de um barranquista no Parque de Guara. Além do mais, as águas de Rodellar são tão geladas que o uso de roupa de neoprene (ou Long John para os surfistas) durante o barranquismo é essencial.
Mas como o que me motiva é a escalada, ainda não consegui praticar o barranquismo, nem nos dias de descanço. Pensando bem, acho que nunca conseguirei, tamanho o meu foco na escalada. E por falar em escalada, o que é Rodellar? É simplesmente, no meu ponto de vista, o melhor lugar de escalada esportiva do planeta, disparado! Tá certo que ainda preciso viajar muito só para conhecer os picos mais badalados e famosos do mundo, como as ilhas paradisíacas da Tailândia. Mesmo assim eu posso afirmar categoricamente que Rodellar é mágico, possui uma áurea alienígena, sobrenatural. É como se não ficasse na Espanha, mas em um lugar melhor, mais nobre, mais alto astral, um lugar que não pertence a este mundo. A comunidade vibra com a escalada, te coloca para cima, induz a sua cadena.
Como já conhecíamos o lugar, fizemos questão absoluta de retornar. Ainda bem, pois o tempo estava muito bom, quente e seco. A partir da cidade, chega-se à base de umas 20 falésias diferentes com menos de 15 minutos de caminhada, com predominância de vias muito negativas e longas, cheias de agarrões e pinças. É incrível como uma via só de agarras boas tem a capacidade de tijolar os braços tão intensamente. Mesmo com a temperatura passando dos 35 graus, a escalada na sombra, no final de tarde (ou noite segundo o relógio), era excelente. O mesmo calor que castiga alguns também faz a alegria de outros: as magníficas chorreras que caracterizam as vias mais clássicas de Rodellar estavam todas secas, sem exceção. Ao meu ver, Rodellar só tem um ponto fraco: o excesso de chuva em determinadas ocasiões. Quando a água permeia a rocha a ponto de molhar as chorreras, estas demoram mais de semana para secar, mesmo que não chova mais e faça calor.
A escalada em chorreras – ou tufas – é o principal atrativo das vias em Rodellar, o que exige uma movimentação especial por parte do escalador. É preciso ter muita técnica em oposição devido à grande quantidade de pinças, além de ser fundamental o entalamento de joelho – el potre. Entalar o joelho corretamente é tão importante quanto manter a respiração. Eu arrisco a dizer que existem 3 estágios de aprendizado acerca do entalamento:
1°) aprender a entalar o(s) joelho(s) em locais óbvios, de fácil entalamento / descanço;
2°) aprender a descansar com o(s) joelho(s) entalado(s) em locais medianos / desconfortáveis;
3°) aprender a movimentar-se com o(s) joelho(s) entalado(s) em locais medianos / desconfortáveis.
A movimentação das mãos com o(s) joelho(s) entalado(s) gera, inicialmente, um enorme desconforto devido à forte tensão corporal exigida. Mas quando se pega o jeito, a economia de forças na movimentação é capaz de elevar o grau da cadena em cerca de duas letras.
1°) aprender a entalar o(s) joelho(s) em locais óbvios, de fácil entalamento / descanço;
2°) aprender a descansar com o(s) joelho(s) entalado(s) em locais medianos / desconfortáveis;
3°) aprender a movimentar-se com o(s) joelho(s) entalado(s) em locais medianos / desconfortáveis.
A movimentação das mãos com o(s) joelho(s) entalado(s) gera, inicialmente, um enorme desconforto devido à forte tensão corporal exigida. Mas quando se pega o jeito, a economia de forças na movimentação é capaz de elevar o grau da cadena em cerca de duas letras.
Além da chuva que molha, o outro “problema” de Rodellar é o seu tamanho. São tantas falésias, tantas opções de escalada, que se torna difícil definir o local exato para a escalada do próximo dia. No início do texto eu mencionei o setor Surgencia, com suas vias 3 estrelas de 50 metros de altura. Pode parecer estranho, controverso até, mas este setor não tem o mesmo glamour que os setores TOP 4 de Rodellar: Gran Bóveda, Pince Sans Rire, Las Ventanas e La Piscineta. Estes quatro setores são surreais e merecem destaque em função da quantidade de vias ultra-mega-super-clássicas. Destas, só a La Piscineta que destoa, pois fica a cerca de uma hora de caminhada e possui poucas vias (em comparação com os demais setores). Mas vale a pena, e muito. Não só pela escalada, magnífica, mas também pelo passeio e diversão: já se perguntou por que o nome La Piscineta? Em um belo dia, com Sol a pino e previsão de 37 °C, fomos escalar na La Piscineta. Resultado: o dia foi perfeito, escalamos a muerte e ainda passamos frio na sombra tamanha a ventania que soprava na base da falésia. Destes setores, o único que não escalei nesta viagem foi Las Ventanas. Bem que eu queria, mas como podem perceber, eu estava diante de um sério problema: o tamanho de Rodellar. Mas como eu queria ter um problema destes por aqui, bem pertinho de casa...
Rodellar
Uma falésia virgem a caminho de Rodellar
Fabio Gollum - L'any que ve també 9a
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Comunidade Brasileira na base da Gran Bóveda
Fabio Gollum - Nanuk 9a
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Base da La Piscineta
Vista da base da La Piscineta
Comunidade Brasileira após um dia de bate e volta a La Piscineta