Ceüse 2010

Ceüse 2010
Ceüse 2010

14.9.11

Rodellar

Como não poderia deixar de ser, programamos 10 dias de escalada em Rodellar. Não consigo imaginar uma viagem de escalada pela Europa sem uma visita a Rodellar. Localizada dentro do Parque Natural de La Sierra de Guara, na parte espanhola dos Pirenéus, esta pequena e antiga cidade é a porta de entrada para os mais famosos barrancos do parque, como os barrancos de Mascún e Otín. E que barrancos... a visão destes barrancos é um espetáculo à parte. São centenas de falésias à beira-rio formando um labirinto de cânions de calcário permeados por águas cristalinas e gélidas que brotam literalmente da rocha. Aliás, a Surgencia de Mascún, a 15 minutos de caminhada do centro da cidade, é a melhor e mais confiável fonte de água da região, além de dar nome a um setor alucinante com vias de 50 metros de altura (mas qual setor de Rodellar que não é alucinante!?).

Esta combinação barrancos + água virou “esporte”: o barranquismo, que no Brasil é conhecido como “rapel em cachoeira” ou simplesmente “canoying”. Os praticantes de barranquismo na Europa levam este esporte muito a sério, a ponto de haver croquis bem completos das rotas de barranco que contemplam, inclusive, sua graduação de dificuldade. Um dos muitos guias de barranquismo da região chega a ter 104 barrancos (rotas) catalogados. Mas como todo esporte radical, deve ser praticado com instrutores ou guias com experiência e utilizando-se os equipamentos de segurança apropriados. Não é incomum ocorrer a morte de um barranquista no Parque de Guara. Além do mais, as águas de Rodellar são tão geladas que o uso de roupa de neoprene (ou Long John para os surfistas) durante o barranquismo é essencial.

Mas como o que me motiva é a escalada, ainda não consegui praticar o barranquismo, nem nos dias de descanço. Pensando bem, acho que nunca conseguirei, tamanho o meu foco na escalada. E por falar em escalada, o que é Rodellar? É simplesmente, no meu ponto de vista, o melhor lugar de escalada esportiva do planeta, disparado! Tá certo que ainda preciso viajar muito só para conhecer os picos mais badalados e famosos do mundo, como as ilhas paradisíacas da Tailândia. Mesmo assim eu posso afirmar categoricamente que Rodellar é mágico, possui uma áurea alienígena, sobrenatural. É como se não ficasse na Espanha, mas em um lugar melhor, mais nobre, mais alto astral, um lugar que não pertence a este mundo. A comunidade vibra com a escalada, te coloca para cima, induz a sua cadena.

Como já conhecíamos o lugar, fizemos questão absoluta de retornar. Ainda bem, pois o tempo estava muito bom, quente e seco. A partir da cidade, chega-se à base de umas 20 falésias diferentes com menos de 15 minutos de caminhada, com predominância de vias muito negativas e longas, cheias de agarrões e pinças. É incrível como uma via só de agarras boas tem a capacidade de tijolar os braços tão intensamente. Mesmo com a temperatura passando dos 35 graus, a escalada na sombra, no final de tarde (ou noite segundo o relógio), era excelente. O mesmo calor que castiga alguns também faz a alegria de outros: as magníficas chorreras que caracterizam as vias mais clássicas de Rodellar estavam todas secas, sem exceção. Ao meu ver, Rodellar só tem um ponto fraco: o excesso de chuva em determinadas ocasiões. Quando a água permeia a rocha a ponto de molhar as chorreras, estas demoram mais de semana para secar, mesmo que não chova mais e faça calor.

A escalada em chorreras – ou tufas – é o principal atrativo das vias em Rodellar, o que exige uma movimentação especial por parte do escalador. É preciso ter muita técnica em oposição devido à grande quantidade de pinças, além de ser fundamental o entalamento de joelho – el potre. Entalar o joelho corretamente é tão importante quanto manter a respiração. Eu arrisco a dizer que existem 3 estágios de aprendizado acerca do entalamento:
1°) aprender a entalar o(s) joelho(s) em locais óbvios, de fácil entalamento / descanço;
2°) aprender a descansar com o(s) joelho(s) entalado(s) em locais medianos / desconfortáveis;
3°) aprender a movimentar-se com o(s) joelho(s) entalado(s) em locais medianos / desconfortáveis.
A movimentação das mãos com o(s) joelho(s) entalado(s) gera, inicialmente, um enorme desconforto devido à forte tensão corporal exigida. Mas quando se pega o jeito, a economia de forças na movimentação é capaz de elevar o grau da cadena em cerca de duas letras.

Além da chuva que molha, o outro “problema” de Rodellar é o seu tamanho. São tantas falésias, tantas opções de escalada, que se torna difícil definir o local exato para a escalada do próximo dia. No início do texto eu mencionei o setor Surgencia, com suas vias 3 estrelas de 50 metros de altura. Pode parecer estranho, controverso até, mas este setor não tem o mesmo glamour que os setores TOP 4 de Rodellar: Gran Bóveda, Pince Sans Rire, Las Ventanas e La Piscineta. Estes quatro setores são surreais e merecem destaque em função da quantidade de vias ultra-mega-super-clássicas. Destas, só a La Piscineta que destoa, pois fica a cerca de uma hora de caminhada e possui poucas vias (em comparação com os demais setores). Mas vale a pena, e muito. Não só pela escalada, magnífica, mas também pelo passeio e diversão: já se perguntou por que o nome La Piscineta? Em um belo dia, com Sol a pino e previsão de 37 °C, fomos escalar na La Piscineta. Resultado: o dia foi perfeito, escalamos a muerte e ainda passamos frio na sombra tamanha a ventania que soprava na base da falésia. Destes setores, o único que não escalei nesta viagem foi Las Ventanas. Bem que eu queria, mas como podem perceber, eu estava diante de um sério problema: o tamanho de Rodellar. Mas como eu queria ter um problema destes por aqui, bem pertinho de casa...


Rodellar

Uma falésia virgem a caminho de Rodellar

Fabio Gollum - L'any que ve també 9a

Fabio Gollum - L'any que ve també 9a

Fabio Gollum - L'any que ve també 9a

Fabio Gollum - L'any que ve també 9a

Fabio Gollum - L'any que ve també 9a

Fabio Gollum - L'any que ve també 9a

Comunidade Brasileira na base da Gran Bóveda

Fabio Gollum - Nanuk 9a

Fabio Gollum - Nanuk 9a

Fabio Gollum - Nanuk 9a

Fabio Gollum - Nanuk 9a

Fabio Gollum - Nanuk 9a

Fabio Gollum - Nanuk 9a

Fabio Gollum - Nanuk 9a

Fabio Gollum - Nanuk 9a

Fabio Gollum - Nanuk 9a

Fabio Gollum - Nanuk 9a

Fabio Gollum - Nanuk 9a

Fabio Gollum - Nanuk 9a

Base da La Piscineta

Vista da base da La Piscineta

Comunidade Brasileira após um dia de bate e volta a La Piscineta

23.8.11

Arco

Ao final da estadia na Alemanha, partimos eu e Juliana rumo à Áustria. O objetivo era escalar no granito austríaco em Zillertal, Tirol. No entanto, nossa viagem coincidiu com a entrada de uma frente fria. O tempo ruim fez com que mudássemos nossos planos e acabamos por passar dois dias nas redondezas de Innsbruck. Aproveitamos para escalar em Tivoli – o muro de escalada mais voltado ao treinamento que conheci até hoje. Vimos a equipe austríaca de escalada treinar para o mundial de Arco, quando parte do muro foi fechado e disponibilizado com exclusividade para o treino da equipe. Muito legal ver o foco tanto dos atletas quanto do muro de escalada nos treinamentos, com utilização inclusive de colete para sobrecarga. Não é à toa que os Austríacos têm dominado os campeonatos de dificuldade e boulder, com destaque para Anna Stöhr, Angela Eiter, Jacob Schubert e Killian Fischuber.

Após dois dias de muito volume em Tivoli, continuamos a viagem até Arco, cidade turística na Itália, próxima ao Largo Di Gardia. Como era verão e período de férias, a cidade estava lotada. O mais interessante é que os turistas vêm para curtir as montanhas e praticar esportes, principalmente ciclismo e escalada. A cidade é, inclusive, passagem obrigatória do Tour de France, a mais famosa prova de ciclismo do mundo. Conheci diversas pessoas que praticavam ambos os esportes.

Arco respira escalada. No centro da cidade tem um placar eletrônico fazendo a contagem regressiva até o dia do Campeonato Mundial de Escalada (na época faltava um mês para o evento). Esta competição pode ser considerada a mais importante do mundo, pois nela se consagram os campeões mundiais de escalada, direto, sem rankeamento. O outro campeonato organizado pela IFSC, a Copa do Mundo de Escalada, é disputado através de várias etapas em países diferentes e os campeões são decididos via pontuação (www.ifsc-climbing.org). Cartazes sobre escalada estão por todas as partes. Muitos bares e lojas têm TV passando filmes de escalada, inclusive a livraria da cidade. O guia de escalada é vendido em todas as lojas, até nas bancas de jornal. Aliás, se o intuito for fazer compras de equipamento de escalada, Arco é quase insuperável. A cidade possui quatro lojas especializadas em escalada, sem contar as lojas mais específicas como La Sportiva, North Face e Salewa, e o fluxo de turistas escaladores (leia-se compradores) é tão alto, que os equipamentos tendem a ser muito baratos, em função da concorrência e do elevado volume de vendas.

Com relação à escalada em si, Arco é fenomenal. As falésias estão entranhadas na cidade, cercando-a de calcário. O Castelo de Arco, cujo visual é deslumbrante, fica no cume de um imenso paredão rochoso. Arco possui diversos setores de escalada nas redondezas, assim como as demais cidades vizinhas. Tem escalada para todos os gostos, desde esportivas até paredes e vias ferratas. Em todas as partes se vê escaladores e se ouve o cintilar das ferragens. O setor mais famoso chama-se Massone e fica a cerca de três quilômetros do centro da cidade. Somente neste setor (incluindo o subsetor El Pueblo) deve haver mais de 300 vias. Apesar de haver algumas vias muito polidas de tão frequentadas, a grande maioria das vias são muito bem protegidas e de elevada qualidade. Para quem gosta de pizza, escalada e ciclismo, Arco é um prato cheio!

Chegando em Arco

Chegando em Arco

Fabio Gollum - Ape Poker 8a

Fabio Gollum - Ape Poker 8a

Fabio Gollum - Ape Poker 8a

Fabio Gollum - Ape Poker 8a

Visual da falésia de Belvedere; no fundo a falésia de Nago

Fabio Gollum - Big Spender 8c

Fabio Gollum - Big Spender 8c

Fabio Gollum - Big Spender 8c

Fabio Gollum - Big Spender 8c

Fabio Gollum - Big Spender 8c

Fabio Gollum - Big Spender 8c

Castelo de Arco

Vista do Castelo de Arco

1.8.11

Frankenjura

Enquanto a escalada esportiva ainda caminha no Brasil, na Europa é tradição há décadas. Em 1991, Wolfgang Gullich fez história ao realizar o FA da via Action Direct, 11c (9a fr), em Frankenjura. Um feito marcante uma vez que esta via permaneceu como a via mais difícil do mundo por vários anos até o Chris Sharma mandar a Realization (12a ou 9a+ fr). Action Direct foi a primeira via de 11c a ser encadenada no mundo e é considerada referência mundial, ou benchmark, neste grau. Para encadená-la, Gullich inventou o campus board – ele treinava campus de monodedo, simplesmente bizarro! 20 anos se passaram e Action Direct permanece como objetivo de cadena de todos os escaladores esportivos.

No entanto, Frankenjura não se resume à via Action Direct. Pelo contrário, Frankenjura é um Parque Nacional na Alemanha e possui dezenas de falésias, talvez possua centenas, cada uma com 10 a 150 vias!!! Uma curiosidade: o nome correto do parque, que fica na Bavária, é Frankische-Schweiss, mas, por motivos óbvios, a comunidade escaladora conhece a região, que tem cerca de 5000 km², como Frankenjura.

Início de junho passei uma semana me divertindo em Frankische... jura! Clima agradabilíssimo, calcário da melhor qualidade, cheio de buracos no melhor estilo curto e grosso – boulder! Mas com tantas falésias e tantas vias, é possível escalar vias longas e bonitas também, é só procurar... Aliás, procurar vias com o Guia de Frankenjura (o preto, de duas edições) é moleza caso tenha um GPS. Basta colocar as coordenadas e pronto, chega-se ao destino rapidamente. É claro que para poder aproveitar a plenitude da região é preciso ter um carro à disposição. Mas vale muito a pena. O lugar é mágico, e fica na Alemanha: organização plena; povo educado, silencioso e solícito; muita bratwurst com mostarda e chucrute, regados a cervejas de todos os tipos; sem contar as dezenas de estradas vicinais sem nenhum buraco, além das Autobahn’s (ou autovias ou vias expressas) que não possuem limite de velocidade nem pedágio! Pode parecer óbvio, mas eu preciso destacar que nas Autobahn’s não existe sinal (semáforo), somente viadutos na forma de trevo! Ou seja, em 20 minutos chega-se a qualquer falésia na região, a depender da disposição em apertar o acelerador.

Dentre as falésias que eu conheci, Schlossbergwand e o complexo Rolandfels / Rote Wand / Diebesloch foram as que eu mais gostei. Mas, na verdade, fui embora com a sensação de que será preciso fazer várias viagens só pra conhecer (quase) todas as falésias de Frankenjura.

1° dia de escalada em Frankenjura

 Fabio Gollum - Dezentraler Energiepfad 7c

Fabio Gollum - Sledgehammer 8c

Fabio Gollum - Sledgehammer 8c

Fabio Gollum - Sledgehammer 8c

Fabio Gollum - Sledgehammer 8c

Fabio Gollum - Sledgehammer 8c

Fabio Gollum - Sledgehammer 8c

Dia de turista em Bamberg

Celebrando mais um dia de escalada em Frankenjura

17.5.11

Serra do Cipó

Ou Cipózin para os mais íntimos, é sem sombra de dúvida a Meca da escalada esportiva no Brasil. Seus afloramentos rochosos de calcário proporcionam uma escalada de qualidade magnífica, sem gastar a pele da forma como estamos acostumados (nós do Rio de Janeiro). As centenas de vias em calcário manteiga do Cipó são recheadas de regletes com um pitaco de abaulados, pinças e copos. Há vias esportivas para todos os gostos: técnicas, atléticas e até tradicionais (em móvel). Mas, na minha opinião, o filé mignon são as vias esportivas atléticas, que, na vasta maioria, são muito bem grampeadas.

Localizado a pouco mais de 100 km de Belo Horizonte, às margens da rodovia MG-010, a Serra do Cipó fica na cidade de Santana do Riacho, distrito Serra do Cipó (antigo distrito Cardeal Mota). O Parque Nacional Serra do Cipó possui 3 entradas principais a um custo acessível e é repleto de cachoeiras lindíssimas ao longo de dois grandes Cânions, o das bandeirinhas e o do Travessão. Algumas cachoeiras, no entanto, têm acesso por trilhas marginais enquanto outras estão fora do Parque Nacional, porém dentro de propriedades particulares. A Cachoeira mais famosa da região e 3ª maior do Brasil, a Cachoeira do Tabuleiro, fica a uma hora e meia de carro continuando a MG-010, no município de Conceição de Mato Dentro. Esta cidade possui vários setores de boulder em quartzito de primeira qualidade e com certeza merece uma visita.

Com relação aos setores de escalada, ao contrário do que possa parecer, não se localizam dentro do Parque, mas sim dentro da APA – Área de Proteção Ambiental – Morro da Pedreira. Por isso, não é preciso pagar para escalar na Serra do Cipó. Esta APA foi uma enorme conquista da comunidade escaladora pela conservação do local que estava sendo explorado através da extração mineral.

O principal setor de escalada chama-se Grupo 3, ou G3, e fica a cerca de 20 min de caminhada a partir da estrada de terra que leva à Santana do Riacho. No G3 estão os sub-setores Anfiteatro, Sala da Justiça e Cangaço, além de várias outras vias espalhadas no caminho. Outros setores que são muito frequentados são:

i) Grupo 1 ou G1 – dentro da Pousada Morro da Pedreira, da Zulma, engloba também o sub-setor Vale de Blair, que faz sombra o dia inteiro;
ii) Setor Foda – fica logo após o G3, em direção ao G2 (nunca fui ao G2 e não sei se rola escalada neste setor, mas como é o Cipó, alguma coisa deve ter, pelo menos em móvel);
iii) Grupo 4 ou G4 – setor bem afastado que não é frequentado, mas possui muitas vias em móvel e potencial para a abertura de diversas vias em proteção fixa.

Neste ano, entre abril e maio, pude ficar algumas semanas na Serra do Cipó. Rolou muita escalada no Grupo 3 e a cada dia de descanso uma cachoeira diferente. Sinceramente, eu não preciso de mais nada. O lugar é tão perfeito, tão bão de mais, que dá vontade de fazer o mesmo que alguns amigos, simplesmente alugar uma casa e me mudar. Quem sabe né? Um dia eu ainda tomo coragem e faço isso. Nesse meio tempo conheci 2 setores de boulder em Conceição do Mato Dentro e, apesar do calor que estava durante o dia, escalamos vários boulders na sombra e na maior vibe.


Juliana - 1a parte da Ética Decomposta 8a

Juliana - Libera o Cliente 8b

Juliana trabalhando a 1a parte da Heróis da Resistência 9a

Juliana trabalhando a 1a parte da Heróis da Resistência 9a

Juliana trabalhando a 1a parte da Heróis da Resistência 9a

 Fabio Gollum - Heróis da Resistência 9c

 Fabio Gollum - Sombras Flutuantes 9b

 Fabio Gollum - Sombras Flutuantes 9b

 Fabio Gollum - Sombras Flutuantes 9b

Sala da Justiça

Galera na Cachoeira Congonhas

Cachoeira Congonhas

Cachoeira Grande - onde está wally?